top of page
Buscar

Obrar ( Manoel de Barros)

  • Foto do escritor: Banheiro Seco
    Banheiro Seco
  • 3 de nov. de 2020
  • 1 min de leitura

Atualizado: 27 de jan. de 2021






Naquele outono, de tarde, ao pé da roseira de minha avó, eu obrei.

Minha avó não ralhou nem.

Obrar não era construir casa ou fazer obra de arte.

Esse verbo tinha um dom diferente.

Obrar seria o mesmo que cacarar.

Sei que o verbo cacarar se aplica mais a passarinhos.

Os passarinhos cacaram nas folhas nos postes nas pedras do rio nas casas.

Eu só obrei no pé da roseira da minha avó.

Mas ela não ralhou nem.

Ela disse que as roseiras estavam carecendo de esterco orgânico.

E que as obras trazem força e beleza às flores.

Por isso, para ajudar, andei a fazer obra nos canteiros da horta.

Eu só queria dar força às beterrabas e aos tomates.

A vó então quis aproveitar o feito para ensinar que

o cago não é uma coisa desprezível.

Eu tinha vontade de rir porque a vó contrariava os

ensinos do pai.

Minha avó, ela era transgressora.

No propósito ela me disse que até as mariposas gostavam

de roçar nas obras verdes.

Entendi que obras verdes seriam aquelas feitas no dia.

Daí que também a vó me ensinou a não desprezar as coisas desprezíveis.

E nem os seres desprezados.


(Memórias Inventadas: As Infâncias de Manoel de Barros - Editora Planeta).



 
 
 

Comments


Este site é uma declaração de amor à Terra e um convite à reconexão com os ciclos naturais da Vida

dentro e fora de nós. 

A proposta é tecer em conjunto as possibilidades em busca experienciar propósitos de cuidado com a Natureza e bem viver coletivo abrindo caminhos para a grande virada.

Seguimos adubando <3

PcP-Button.gif

© 2020 por Tamires Panche. Todos os direitos reservados.

bottom of page